Seremos seres humanos melhores

 


 


 “O declínio da pobreza global é uma das conquistas mais importantes da história, mas o fim da pobreza ainda está muito distante”. Max Roser


Introdução

A humanidade está evoluindo por milênios. Demos um grande salto, saímos da posição de individuo caçador coletor, formamos as primeiras comunidades e agora estamos vivendo numa sociedade tecnológica.

Estamos nos transformando em seres humanos melhores?

Aqui cabe uma reflexão sobre o que é melhor. São muitas as opiniões e vou seguir uma vertente que me conforta e que me estimula a caminhar no rumo do amanhã.

Quem somos nós? Somos o homo sapiens – humano sábio – distinto de todos os outros animais por causa de nossos poderes de linguagem, raciocínio, imaginação e tecnologia. Isso, nos marca como uma forma de vida particular, diferente de outros tipos de vida animal e vegetativa.

Uma vez que temos esta dimensão, deveríamos compreender que um benefício não se aplica apenas a uma individualidade. Deve ser estendido a todos e quando isso não ocorre é papel de quem tem, levar a quem não tem ou, não estaríamos fazendo jus a marca de ser diferente, especial. Também deveríamos compreender que o meio ambiente com os outros tipos de vidas animais e vegetativas, bem como o solo e água, compõem o meio em que vivemos e nos alimenta como alimentou nossos antepassados e deve alimentar as gerações futuras.

Seremos melhores como humanos guando respeitarmos eticamente o nosso semelhante de espécie e todo o meio em que vivemos.

Retorno à pergunta. Estamos nos transformando em seres humanos melhores?

Não há ainda perfeição e, provavelmente nunca a teremos, mas há sinalizações de que sim, estamos melhorando em muitos aspectos.

As melhoras demoram muitos anos para acontecerem e, de fato, serem distribuídas para todos. Já os problemas nos atingem de imediato e criam uma sensação de que as coisas só pioram. Pensar assim é uma característica do ser humano e é reforçada pelas mídias que se concentram em noticiar e divulgar problemas. Não só as mídias de notícias do cotidiano, mas também as mídias de entretenimento que tem uma preferência em destacar o lado negativo da vida.

Junto com o progresso tivemos concentração de riquezas, disputas de toda natureza desde as pequenas até as guerras mundiais, desigualdades sociais, utilização em larga escala dos recursos finitos do planeta.

Vamos então ver onde temos melhorado e nossos problemas. Os detalhes desta exposição são baseados em relatório de Max Roser, economista de Oxford por trás do Our World in Data, que dedicou sua carreira a difundir uma visão estatística do desenvolvimento global, artigo de Jerome C. Glenn futurista que atua como diretor executivo do Projeto Millennium e um artigo de Hugo Slim

Onde estamos melhorando

Extrema pobreza. Há 200 anos cerca de 90% da humanidade vivia em extrema pobreza (menos de 1.90 dólar por dia). Hoje 9% da humanidade vive nesta situação. Grande feito? Sim, sem dúvida, ainda mais se considerarmos que neste período a humanidade pulou de 1 bilhão para 7,8 bilhões de pessoas. Devemos nos conformar? Não, em absoluto. Reduzimos a extrema pobreza, mas o fim da pobreza ainda está muito distante. Temos muitos semelhantes para trás e devemos resgatá-los não só no aspecto da pobreza como em muitos outros.

Saúde. Nos últimos dois séculos, todos os países do mundo fizeram progressos muito rápidos contra a mortalidade infantil. De 1800 a 1950, a mortalidade global caiu pela metade, de cerca de 43% para 22,5%. Desde 1950, a taxa de mortalidade diminuiu cinco vezes para 4,5% em 2015. Todos os países do mundo se beneficiaram desse progresso.

Neste mesmo período, a expectativa de vida aumentou globalmente, de menos de 30 anos para mais de 72 anos distribuídos da seguinte forma:

Na Oceania de 35 para 79 anos.

Na Europa de 34 para 79 anos.

Nas Américas de 35 para 77 anos.

Na Ásia de 27,5 para 73,6.

E na África de 26 anos para 63 anos 

Erradicamos a varíola e a peste bovina. A pólio, verme de guiné e bouba devem ser as próximas. Sarampo, caxumba e rubéola são três doenças virais que podem ser prevenidas pela vacinação infantil.

O saneamento e a vacinação tem sido as forças aliadas para diminuir os casos de doenças

Direitos humanos e democracia. Há 200 anos, todos careciam de direitos democráticos. Agora, bilhões de pessoas os têm. Este movimento ocorreu desde que os revolucionários franceses invadiram a prisão da Bastilha em 1789 em busca de liberdade, igualdade e fraternidade. Hoje 5,9 bilhões de pessoas vivem em países onde tem algum direito de escolha de seus líderes, dependendo do estilo de governo e 1,9 bilhões vivem em autocracias fechadas. Basicamente puxada pela China com 1,4 bilhões de pessoas.

A democracia é muito importante para a evolução da economia, saúde, educação, direitos sociais e felicidade do povo, entre outros aspectos.

O aumento da participação feminina na força de trabalho foi um dos desenvolvimentos econômicos mais notáveis ​​do século passado. Ocupam 18% das posições de liderança nas empresas, percentual desigual, mas que tende a crescer. As mulheres também estão presentes nas lideranças de estado sendo citadas como exemplos de gestão principalmente por ocasião da pandemia do Covid 19.

A discussão de gêneros ganhou transparência e deve evoluir.

População. A população cresceu muito nos últimos 200 anos basicamente baseada na melhoria da saúde, saneamento e queda da mortalidade infantil. A taxa de crescimento foi de 2,2% até 1960 e de lá para cá caiu para 1,05% ao ano, ou seja, o pico já ocorreu. Segundo estudos de Roser quando a economia melhora as pessoas tendem a ter menos filhos. Até 2100 seremos 10.8 bilhões, mas com taxas de crescimento próximas de zero.

Educação. Em 1820 apenas 12% da população mundial sabia ler e escrever e hoje a situação se inverteu apenas 14% da população é analfabeta.

Melhorias na alfabetização antecederam a Revolução Industrial e, em muitos aspectos, a elevação do padrão de vida só foi possível graças a um público cada vez mais instruído. O crescimento econômico é possível quando entendemos melhor como produzir as coisas de que precisamos e traduzimos esses insights em melhorias tecnológicas que nos permitem produzi-las com mais eficiência. Tanto o desenvolvimento de novas tecnologias (inovação) quanto seu uso na produção dependiam de uma população muito mais instruída. 

Alimentação. Os dados robustos sobre a prevalência da nutrição no mundo datam de 2000 e de lá para cá, pode-se dizer que a desnutrição caiu de 13,4% para 8,8%, entretanto uma luz de alerta está acessa pois nos últimos anos ela deu uma oscilada para cima em 2013, 643 milhões de pessoas estavam na condição de subnutridas e em 2017 subiu para 663.

Energia. A participação da energia renovável na matriz energética - que considera todas as fontes de geração de energia- vem aumentado nos últimos anos e hoje ela representa 15% com projeção de ser 28% em 2050. Na matriz elétrica hoje ela representa 31 % e a projeção para 2050 é ser 49%.

A ocupação deste espaço é muito importante na redução de emissões de gases de efeito estufa.

Acesso a água potável. No ano 2000 apenas 62% da população tinha acesso a água potável e hoje 75% da população tem acesso. Uma melhora, mas lenta considerando a importância da água de fonte segura na saúde e na redução da mortalidade.

Acesso a inovações tecnológicas. As inovações tecnológicas em todas as áreas da ciência estão ficando cada vez mais baratas permitindo o acesso de bilhões de pessoas. Como consequência isso se traduz em mais desenvolvimento. Um dos exemplos é o acesso à internet uma das inovações mais transformadoras e de rápido crescimento. Globalmente, o número de usuários da Internet aumentou de apenas 413 milhões em 2000 para mais de 4,66 bilhões em 2021.

Violência e Guerra. Não há uma forma aceitável para falar sobre mortes originadas pelo ser humano. A violência de toda natureza nos diminui, mas elas têm decrescido desde 1946. No período imediato ao pós segunda guerra mundial as mortes representavam meio milhão de pessoas e em 2016, considerando o conflito do oriente médio e as mortes de violência unilateral, elas representavam 103 mil. Voltando ao ano 2010, antes do conflito do oriente médio, elas representavam 30 mil e considerando o ano de 1994 onde tivemos um genocídio em Ruanda elas foram de 547 mil. Tirando os extremos os especialistas no tema dizem que nunca tivemos um período de paz tão duradoura na história da humanidade. Mas nada para orgulhar.

Onde precisamos melhorar

Além de continuar com as melhorias nos itens abordados devemos buscar avanços em áreas como:

Emissões de gases de efeito estufa. Para progredir na redução das emissões de gases de efeito estufa devemos aumentar a produção de eletricidade por fontes renováveis, intensificar o uso da fonte elétrica nos meios de transportes, melhorar a eficiência energética, reduzir o consumo de proteínas animal, melhorar o rendimento das colheitas e reduzir o desperdício de alimentos.

Biodiversidade. A extinção de algumas espécies e a ameaça de extinção de outras se deve pela destruição dos seus habitats, poluição e utilização excessiva do solo entre outros. A recuperação delas pode não ocorrer ou demorar muitos séculos. Vamos ver alguns exemplos:


 

Quantidade de espécies extintas

Aves

159

Mamíferos

85

Peixes

80

 

 

Quantidade de espécies extintas

Peixes

3040

Anfíbios

2390

Insetos

1848

Emprego. Embora o número de empregos eliminados seja superado pelo número de empregos criados, a ocupação destas novas oportunidades, que envolvem novas tecnologias, é lenta em função da falta de competências para as funções.

Outras áreas:

  • Poluição do solo, rios e oceanos
  • Diminuição das dívidas dos países
  • Diminuição da desigualdade de renda
  • Eliminação do trabalho infantil
  • Combate à corrupção
  • Construção de moradias
  • Saneamento e água potável
  • Diminuição dos gastos militares e redução do arsenal nuclear
  • Educação em novas tecnologias

Geração de hoje

A pandemia do COVID 19 fez um despertar para uma nova humanidade.

Estar diante da morte, ver seu contrato de trabalho ser revisto ou cancelado bem como, ter familiares e amigos diante da mesma situação amoleceu muitos corações no mundo todo.

Ficar em casa possibilitou, para muitas pessoas, maior aproximação com os entes queridos. Puderam fazer um balanço do quanto estavam distantes e alienados destas vidas. Pais e adultos além de atuarem no home office, se tornaram professores, cuidadores e brincaram novamente.

As comemorações de aniversários e outros eventos à distância exigiram criatividade ao mesmo tempo que possibilitou uma ressignificação do valor real da proximidade entre as pessoas.

Nestes tempos nunca a solidariedade esteve tão em alta como as doações de alimentos, dinheiro, bens materiais e até as cantorias nas janelas, tudo para gerar um mínimo de conforto, alívio e bem-estar ao próximo, bem como a colaboração entre cientistas e nações na elaboração da vacina.

Geração do amanhã

Segundo Tony Wagner do laboratório de Inovação de Harvard quando questionado sobre como preparar as crianças para o futuro. Ele destacou que a maior preocupação deveria ser como desenvolver capacidades nas crianças que dessem a elas uma autonomia e resiliência para uma vida de estudos muito variada e constante. As capacidades seriam:
  • pensamento crítico: estimular o questionamento e o que fazer em resposta a uma observação;
  • colaboração: fazer as coisas com outras pessoas;
  • comunicação: saber se expressar bem de forma oral e escrita;
  • criatividade: pensar em soluções diferentes e originais para os problemas;
  • empatia: sentir o que sentiria uma outra pessoa caso estivesse na mesma situação vivenciada por ela, amor e interesse pelo próximo e à capacidade de ajuda,
  • visão moral da vida: saber o que é certo e errado.

As gerações futuras serão assim, elas estarão extremamente conectadas com as inovações e entre si. É uma ilusão pensar que elas não estão se ligando aos problemas dos outros e ao meio ambiente. Estão sim, de forma diferente como ocorreu com as gerações anteriores e acho que de forma mais intensa. Não me recordo de ter feito tanta coisa na minha infância como vejo em meus netos e seus próximos.

Conclusão

Vimos que a jornada para frente é longa, mas tudo que descrevemos aqui foi fruto de uma reação humana em melhorar e superar obstáculos naturais e outros construídos. Muitos valores de natureza pessoal foram reforçados gerando a expectativa de que seremos novos seres humanos. O futuro brilhante da humanidade não se dará apenas pelos avanços tecnológicos, mas também por estes novos seres humanos.

Vídeo

Seremos seres humanos melhores | Carlos Pimenta https://youtu.be/bcj-jmcoqCo

 Consulte e veja mais vídeos sobre outros temas na Página Vídeos recomendados.

Referências

A história do fim da pobreza está apenas começando | Max Roser

15 Global Challenges for the Next Decades | Jerome C. Glenn

Os gráficos que mostram o avanço espetacular da humanidade nos últimos dois séculos | Jaime Rubio Hancock

O progresso da humanidade na história e o que isso significa para o futuro | Steven Pinker

Expectativa de Vida | Max Roser, Esteban Ortiz-Ospina e Hannah Ritchie (2013) -. Publicado online em OurWorldInData.org.

Saúde Global | Esteban Ortiz-Ospina e Max Roser (2016) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Erradicação de Doenças | Max Roser, Sophie Ochmann, Hannah Behrens, Hannah Ritchie e Bernadeta Dadonaite (2014) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Democracia | Max Roser (2013) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Retorno à Educação | Max Roser e Mohamed Nagdy (2013) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Água Limpa e Saneamento | Hannah Ritchie e Max Roser (2021) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Produção Agrícola | Hannah Ritchie e Max Roser (2020) - Publicado online em OurWorldInData.org.

CO e emissões de gases de efeito estufa | Hannah Ritchie e Max Roser (2020) - Publicado online em OurWorldInData.org.

Relatório Future of Jobs 2020 | World Economic Forum - WEF

O poder da humanidade: sobre ser humano agora e no futuro | Hugo Slim

 

 

 

 

 

 

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